Falo do Lago Inle.
Depois de uma curta viagem de avião de Mandalay, aterrámos no aeroporto de Heho, ansiosos por ver, se continuaríamos a ser surpreendidos, sabendo que provavelmente já era pedir um bocadinho de mais! Não foi, e a descrição que se segue, é prova disso mesmo...
No aeroporto, fomos “recolhidos” por uma guia fantástica, que nos acompanharia nos dias seguintes. A primeira parte do percurso que nos levaria ao nosso destino, foi realizado de carro, e proporcionou-nos tomar contacto com a paisagem das montanhas do Nordeste Birmanês. Dominava a cultura do arroz, onde os agricultores com água pela cintura e de chapéu de palha em bico, tiravam a pulso o seu sustento daquela terra fértil.
Pelo caminho, parámos num bonito mosteiro budista, integralmente construído em teca, que nos deixou saudades. Fazendo uma comparação com a nossa realidade de outrora, o mosteiro funcionava como os nossos antigos seminários, que colmatavam a falta de estudos para quem não os podia pagar. Também ali, os mais desfavorecidos, encontravam um lar, onde podiam estudar e quem sabe, transformar o mundo…
Era um mosteiro vivo. Assistimos ao momento de higiene diária dos pequenos monges, visitámos o seu dormitório e deambulámos pelo templo embalados pelos místicos sons de mantras recitados por voz juvenis. Foi na realidade uma felicidade a nossa paragem por ali, porque tivemos a oportunidade de ser uns intrusos naquela que é a realidade pura e dura daquela gente, sem maquilhagens ou floreados. Era o que era, e era bonito!
Aquele oásis de madeira, significava a esperança num futuro melhor, aqueles pequenos monges, são a geração vindoura que poderá mudar a face deste país massacrado. Era um pólo cultural, de fascinante essência budista, no meio daqueles infindáveis e maravilhosos campos de arroz explorados por inúmeras gerações. Era na realidade uma escola embuída de um espírito inocente e naif que nos despertou um sentimento de esperança. Esperança na educação, que aprendemos desde tenra idade a apreciar e que cremos será a única “arma” que resta a este povo.
Aconteceu-nos um episódio que na realidade nos deixou bastante envergonhados... Enquanto visitávamos o templo e tomávamos conhecimento das actividades dos monges e dos objectivos deste mosteiro que nos iam sendo relatados cuidadosamente pela nossa guia, reparámos nuns quadros onde estavam inscritas algumas pequenas doações. Como achámos que o mosteiro, cumpria uma missão extremamente digna, quisemos também participar. Fui ao carro, propositadamente, visto que lá tinha deixado o dinheiro e trouxe comigo 5 dólares, para fazer anonimamente a nossa oferta. O Monge responsável ao aperceber-se da nossa intenção, não nos deixou colocar o dinheiro na caixa de esmolas e levou-nos para um local à parte do mosteiro, onde nos fez uma longa bênção bem como um agradecimento pelo nosso gesto. Foi aí que nos sentimos muito pequeninos, porque nos apercebemos que aqueles 5 dólares que são insignificantes para nós, proporcionam a aquisição de uma quantidade de bens impensáveis e que são indispensáveis para a sobrevivência daqueles jovens.
Era altura de continuar o nosso percurso em direcção ao lago, e foi o que fizemos com o coração mais reconfortado.
A visão do lago é um postal ilustrado! As águas plácidas e virtualmente estáticas, contrastam com os picos das montanhas que circundam o lago.
O lago possui 22 quilómetros de comprimento e 11 de largura, albergando cerca de 17 aldeias construídas sobre estacas e que são o lar de mais de 70000 pessoas. A etnia dominante nesta região é a tribo Intha, mas encontram-se presentes também o povo Shan, Pa O, Bamar e Mon.
Parece um local saído de um conto de fadas, onde os jacintos de água parece quererem dar-nos as boas vindas à nossa passagem. A visão das aldeias flutuantes é de uma beleza arrepiante, e o exotismo atinge aqui um patamar superior ao da nossa imaginação. Pequenas embarcações a motor e canoas remadas com um estilo muito próprio, com um braço e uma perna simultaneamente, dão vida às “avenidas” espelhadas que se deparam diante de nós.
Por vezes altares budistas espreitam como que saídos das águas a actividade do lago. Aqui tudo é ancestral, tradicional e autêntico. Verdadeiras “quintas” espraiam-se ao longo de ilhas flutuantes fixadas ao fundo por estacas de bambu. Reina a cultura do tomate e dezenas de pequenas embarcações, passam por nós carregadas deste vegetal em direcção ao mercado.
Mal chegámos, colocaram-nos numa pequena e estreita canoa a motor, que nos levaria, para um dos melhores hotéis que estivemos em toda a nossa vida. O Inle Princess Resort.
Pelo caminho e já nas imediações do hotel que ainda não era visível, trocámos do barco onde estávamos para uma embarcação a remos. Disseram-nos que nas imediações do hotel estavam proibidas embarcações a motor para preservar a paz e tranquilidade dos hóspedes! Bem, se isto já nos pareceu irreal, a imagem que se seguiu, foi algo para que não estávamos seguramente preparados. Embalados pelas águas cálidas do lago, foram surgindo algumas silhuetas, perfeitamente integradas na paisagem, que na exacta medida que se aproximavam de nós nos abriam a boca de espanto! Beliscámo-nos, piscámos várias vezes os olhos e soltámos uns extasiados e anestesiados comentários tipo “eh pá, fogo… espectacular… Será que é mesmo o nosso hotel?”.
O hotel, que despontava também ele sobre estacas por cima do lago, em madeira típica da zona e em tons de castanhos escuros, parecia uma miragem. Os quartos eram sofisticados e simples, recorrendo ao artesanato local. A varanda sobre o lago deslumbrante e as zonas comuns de restaurante, bar, etc. de um bom gosto difícil de designar.
Ficámos por ali o resto da tarde, como que a interiorizar as imagens que ainda povoavam a nossa mente e que nos pareciam ainda tão surreais.
Não tínhamos ainda percebido o que tínhamos feito para merecer tal sorte!
1 comentário:
Belíssimo!!
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