Uma das enormes vantagens do Mara Simba, como já referi anteriormente é o facto de possuirmos uma "janela" aberta para a Savana e para a floresta que abraça o curso ziguezagueante do rio que passa junto ao hotel.
Na varanda sobre palafitas, debruçada sobre o rio um aperitivo ajuda a acompanhar as peripécias do filme da National Geographic que passa diante dos nossos olhos em directo!
Acompanhamos os sempre surpreendentes macacos nas suas brincadeiras arriscadas repletas de saltos acrobáticos e que parecem provocar o grupo compacto de furões que vão fussando aqui e ali.
O filme continua, quando somos despertos por um som pesado e arrastado que parece surgir de fora do "ecrã".
Há medida que o som ritmado aumenta de intensidade, apercebemo-nos que uma enorme iguana se arrasta paralelamente ao rio, despertando a curiosidade de macacos e furões que parecem especialmente exaltados com o acontecimento!
Impassível e quase inanimado o crocodilo ao longe observa com a paciência e indiferença maturadas ao longo de milhões de anos as excitadas e medrosas investidas dos furões contra a iguana, que parece igualmente indiferente a estas criaturas.
Uma gazela esquiva desaparece tão rapidamente como apareceu sob os marabus, que procuram refúgio na hora de mais calor na enorme árvore que lhes serve de abrigo.
A sessão é interrompida pela fome que já aperta e sem dramas ou finais felizes, abandonamos a plateia sabendo que retomaremos o enredo ao entardecer...
Depois do almoço, lá vamos nós de volta à Savana, desafiando as feras com a nossa Hiace!
Lá andávamos nós no encalço de leões e elefantes quando somos surpreendidos pela proposta do James: "- Querem visitar uma aldeia Masai?". "-Claro que sim!-respondemos sem hesitações..."
O povo Masai, transporta-nos inconscientemente para um passado longínquo, onde uma tribo de valorosos guerreiros impunham a sua lei, quer às tribos vizinhas quer aos distraídos leões que se atreviam a cruzar o seu caminho!
Se há algo em que verdadeiramente acredito é que a Vida são os locais e as pessoas que conhecemos. O momento que estamos prestes a viver é um superlativo desta ideia, onde se cruzam os locais inesquecíveis com as pessoas improváveis! É por outras palavras um daqueles momentos que por diversas razões ficarão gravados para sempre na nossa memória! Não há dinheiro que pague as memórias que tenho gravadas, fruto dos locais e pessoas que conheci viajando por aí!
Pensar em tribos Masai, excita sobremaneira a minha imaginação que dispara imediatamente para terrenos místicos e infantis onde histórias de aventureiros e viajantes antigos se cruzavam de forma épica e nem sempre com final feliz, com tribos e povos "selvagens", perdidos nos confins dos territórios inexplorados.
É quase como entrar dentro de um sonho onde nos imaginámos intrépidos aventureiros que terão o primeiro contacto com povos como os Masai, Bosquímanos, esquimós, aborígenes, apaches, guaranis, pigmeus, saamis ou tantos outros, porque por os acharmos primitivos, a curiosidade fica ainda mais aguçada e admiramo-nos como é que se mantiveram fiéis às suas tradições e sobrevivem ainda hoje ligados ao seu modo de vida ancestral.
Foi embuídos deste espírito, que nos apróximámos da aldeia Masai acompanhados de um nervoso miudinho que não conseguíamos explicar.
Mais tarde rir-nos-íamos de tudo isto, mas ainda bem que o vivemos desta forma!
Este nervoso míudinho, era também reflexo de uma constante afirmação pelos próprios guias, que os Masai, para além de serem um povo guerreiro, não seriam muito afáveis com os turistas que andavam pelos safaris, chegando a arremessar violentamente pedras às viaturas quando os turistas os olhavam ou fotografavam!
Com o James como primeiro interlocutor, fiquei à conversa com o jovem chefe da aldeia, fingindo algum relaxamento e descontracção.
Para nós esta personagem ficou sempre o "best", porque na sua introdução a esta visita à pequena aldeia que consistia numas 15 palhotas dentro de um circulo protegido com uma vedação de canas, referiu-me inúmeras vezes que ele era o melhor! "- I am the best! I kill lions with spears!". Basicamente ele estava a transmitir-me que por ser um valentão, tinha sido escolhido para chefe da aldeia. Quem o visse não diria o mesmo, quanto aos leões, sosseguem porque tenho a certeza que não os matou
Estávamos nós em pleno convívio multi-cultural, quando a escassos metros aparece um grupo de Masais a correr vigorosamente, soltando uns gritos estridentes e ameaçadores e antes que tivesse tempo de reagir a este súbito e surpreendente "ataque", já a Xana estava rodeada por eles sem que eu a conseguisse ver bem neste misto de gritos histéricos e saltos altíssimos ao mesmo tempo que lhe acertavam propositadamente com as tranças carregadas de missangas!
Estava eu ainda atordoado com a "surpresa", pensando que ficaria víuvo na minha própria lua de mel, quando ouço o "best" balbuciar: " - welcome dance". " - Ah, uuuh, very nice!" soltei num misto de alívio e perplexidade! A Xana depois de ser chicoteada com as tranças, consegue soltar-se do círculo onde tinha sido encurralada com um enorme sorriso amarelo e pergunta-me se não queria ir para o local do "crime", " - Deixa estar, fica para a próxima..."
Prosseguimos com a visita à aldeia, onde ao mesmo tempo que nos explicavam o tipo de vida nómada da tribo e os seus hábitos e tradições, nos mostravam o interior das suas palhotas feitas com excremento de vaca e palha, o que as tornavam frescas nas horas de maior calor e quentes nas noites frias da Savana. Afinal estamos a quase 2 mil metros de altitude. As palhotas não tinham mais do que 2 divisões para toda a família e não tinham uma única janela. Para as visitar era necesssário retirar uma espécie de "rolha" de uma parede que servia de ventilação e que ao mesmo tempo deixava entrar uns ténues raios de luz que evitaram que pisássemos 2 Masais que dormiam na hora em que entrámos.
Os Masais acreditam ou acreditavam que todas as vacas ao cimo da terra lhes pertenciam, e na realidade toda a sua vida, hábitos e tradições se relacionam com as vacas. Alimentavam-se exclusivamente do leite das vacas e em épocas especiais e festivas, num ritual um pouco chocante para os dias que correm, do seu sangue. Mas nunca matavam vacas para comer, apenas comiam a sua carne quando alguma morria. São um povo nómada dado que se movimentam sempre na procura dos melhores pastos para as suas vacas e fazem-no constantemente e em comunidade. O facto de serem um povo guerreiro, faz com que possuam alguns rituais de virilidade especialmente na passagem para a idade adulta. Para se ser um verdadeiro guerreiro Masai, em tempos idos, era necessário matar um leão sozinho munido apenas da sua lança e assim passavam esta exigente prova de virilidade e valentia. É óbvio que nos tempos que correm, tal já não se passa...
Acompanhados do grupo que compunha o comité de "boas vindas" à aldeia, lá prosseguimos a visita e no seguimento de todas as orgulhosas explicações sobre o seu modo de vida, fizeram-nos uma demonstração de como faziam fogo a partir apenas de uns paus, palha e excrementos de vaca. Num trabalho de equipa bem conjugado, e depois de 3 ou 4 Masais terem friccionado vigorosamente os paus sobre a palha e os excrementos de vaca, conseguiram numa velocidade surpreendente pegar fogo à palha e fazer uma pequena fogueira. Confesso que fiquei surpreendido com a facilidade com que o fizeram, porque lembro-me de em míudo tentar fazê-lo e nunca ter sido bem sucedido...
Até aqui estivemos sempre sozinhos na aldeia e isto deu-nos a sensação romântica descrita atrás, mas tudo rapidamente se desvaneceu com a aparição do casal de japoneses (quem mais poderia ser!) que nos fez lembrar que aquela aldeia era mesmo uma aldeia turística e o mercado com peças artesanais nas traseiras da aldeia para onde fomos levados de seguida não o deixava desmentir!
Até porque soubemos mais tarde, todos os Masais foram expulsos das reservas e Masai Mara não tinha sido excepção... Lá se foi o romantismo! A preservação das espécies não se faz sem alguns inconvenientes...Será que não seria possível preservar também os Masais nas suas terras?
É verdade que os Masais continuam a ser um povo nómada e respeitado como a tribo dos pastores guerreiros. Possuem inclusivamente um estatuto especial que lhes permite atravessar a fronteira com a Tanzânia sem qualquer incómodo, porque a procura dos melhores pastos, não se compadece com a minudência das linhas fronteiriças!
Mesmo sabendo que muito do que vimos e vivemos não se aplica aos dias que correm, é de qualquer forma emocionante perceber que já foi assim e que esta mítica tribo já viveu da forma que nos apresentaram...
prosseguimos viagem e continuamos o nosso safari sempre emocionante!
É tempo de nos despedirmos de Masai Mara e levar eternas recordações connosco, já que amanhã partimos para o Lago Nakuru!
1 comentário:
muito bom...
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