segunda-feira, 23 de junho de 2008

Xian e o seu inigualável exército.

Já parece uma banalidade dizê-lo, mas a China por força da sua riquíssima cultura milenar deve sair o país do mundo com mais inscrições na UNESCO. Por vezes o que parecia difícil era visitar um monumento que não estivesse catalogado neste organismo.

Assim sendo, este dia não seria excepção e fora aguardado também ele com grande expectativa. É compreensível tal o exotismo e extravagância do exército de cavaleiros de terracota descoberto há escassos anos nas redondezas de Xian, mas que já conta com mais de 2000 anos!

Desde a história que envolve a criação deste exército, à sua exuberante dimensão com mais de 6000 soldados, ao perfeccionismo da execução onde não existe uma cara repetida até à sua recente descoberta por agricultores em 1974, tudo se conjuga para o tornar incomparável.

Em 246 AC, Qin Shi Huang, o primeiro imperador chinês, já que unificou uma série de territórios e deu o nome à actual China, subiu ao trono. Consta que era um ditador implacável e possuidor de um poder avassalador, fruto da unificação dos vários reinos. É sabido que na época, os imperadores se faziam acompanhar de inúmeras riquezas e objectos pessoais, para enfrentarem a “outra” vida. Foi assim, que surgiu este exército, para garantir a segurança póstuma do imperador.

Esta história adquire contornos interessantes, já que o imperador quereria enterrar não um exército de terracota mas sim o seu verdadeiro exército! Sim enterrar vivos os próprios soldados para que o acompanhassem e o defendessem na “outra” vida! Um general do imperador, temendo a esperada carnificina e temendo também pela própria vida terá dissuadido o imperador a levar um exército de terracota em vez do exército em funções. Parece que se salvaram desta forma pelo menos 6000 soldados! Ou talvez muitos mais, dado que existem ainda muitos mais para serem desenterrados, mas como perdem as cores com que foram pintados quando são desenterrados, vão ficar a aguardar os avanços tecnológicos que no futuro permitirão a sua perfeita recuperação.

Partimos bem cedo em direcção aos arredores de Xian, onde se encontra o túmulo de Qin Shi Huang, um dos mais impressionantes mausoléus do mundo. Claro que pelo caminho, parámos na fábrica que produz as réplicas em terracota de todos os tamanhos, seguindo a técnica original. Como já é também habitual, foi muito interessante a visita até àquela fase onde a troco de uma visita “gratuita”, nos tentam impingir as réplicas 10 ou 20 vezes mais caras do que acabámos por comprar no mercado em frente ao nosso hotel!

Continuando o caminho chegamos ao local do mausoléu e dos seus guardiões. Os milhares de cavaleiros de terracota de tamanho natural, estão dispostos em 3 fossos, segundo a sua disposição original. Esta disposição, bem como a postura de corpo e indumentária seguem as normas rigorosas, registadas num antigo livro da arte da guerra.

O primeiro fosso, composto de longos corredores, alberga 6000 soldados. A sensação de entrar e ver aquela dimensão, é absorvente se nos lembrarmos que estamos perante mais de 2000 anos de história e não na disneyland. Os pormenores de cada soldado são impressionantes chegando aos detalhes do penteado ou do bigode. O segundo fosso alberga mais 1000 cavaleiros e o terceiro apenas 68, onde se pensa que estivessem as altas patentes daquele exército.

Em 1974, alguns agricultores, nas suas tarefas diárias, escavaram uma zona onde encontraram alguns cacos curiosos. Essa “escavação” tornou-se naquela que é provavelmente a maior descoberta arqueológica do século XX. Hoje em dia esse humilde agricultor, que se tornou famoso por força da sua descoberta, está também presente de corpo e alma no museu, onde autografa um livro oficial com a história e fotografias do local. Consta que há alguns anos atrás, Bill Clinton em visita ao local, comprou o livro oficial e pediu ao humilde agricultor que lhe autografasse o mesmo. Perante o constrangimento geral, descobriram que o agricultor era analfabeto e nem o seu próprio nome sabia assinar. Depois desta gaffe, lá teve o desgraçado que aprender a assinar o nome e a prova é o exemplar autografado orgulhosamente exposto na estante da nossa sala!

Depois de visitarmos todos os fossos e o museu, sempre atentos à esmerada explicação da nossa guia, seguimos para Xian, onde pedimos para nos deixarem nas imediações do templo do grande ganso que pretendíamos visitar depois do almoço.

Foi sem dificuldade, que fizemos uma pausa na gastronomia chinesa e atacámos um McDonalds que nos soube a pato… à Xian!

O templo do grande ganso, transportou-nos para a harmonia e equilíbrio que sempre sentimos nos templos budistas. Remontando ao ano de 652, foi posteriormente restaurado e ampliado, para acolher as escrituras budistas trazidas da Índia pelo monge viajante Xuan Zang, que ali se instalou e as traduziu em 1335 volumes em chinês!

A nossa tarefa ali era bem mais simples e foi com agrado que percorremos o templo assistindo a todos os rituais e cerimónias dos fervorosos crentes.

Depois do verdadeiro “banho de cultura”, nada melhor que uma sestazinha! É que pretendíamos ainda visitar e percorrer as muralhas de Xian, mas para isso era absolutamente necessário retemperar forças…

Outra das (muitas) particularidades que Xian nos oferece, é o facto de ainda existirem as ancestrais muralhas que envolvem a cidade antiga. Para além da sua imponência, proporcionam um belo passeio de bicicleta nas suas largas ameias, com vista privilegiada para a cidade! Fantástico. Deixámos levar-nos pelo romantismo do momento e deixámo-nos abraçar pelo arrebatador final de tarde que nos embalava na nossa despedida de Xian, acompanhados pelas exóticas lanternas vermelhas que coloriam a noite…

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Xian,cidade imperial!

Embora Xian seja essencialmente conhecida por causa dos seus cavaleiros de terracota, os atractivos desta cidade da província de Shaanxi na China central, não se limitam a esse inimitável exército com mais de 2 mil anos.

Ainda Roma não tinha sido fundada nem muitos dos clássicos gregos escritos e já Xian era uma cidade clássica do mundo antigo. Sendo o términus da mítica rota da seda, facilmente se percebe que fosse uma cidade “global” à escala da época. Foi a capital imperial do império do meio. Durante séculos aqui nasceram e morreram dezenas de imperadores e dinastias.

Xian foi o centro do universo chinês e o legado que nos deixa é impressionante.

Quando chegámos a Xian, e dado que ficámos instalados no centro da cidade com vista para a torre do tambor e para a torre do sino, partimos a pé à descoberta da cidade.

Mesmo em frente ao hotel encontrámos um mercado de rua por onde gostamos sempre de passear. Ficamos a conhecer os hábitos locais e tomamos contacto com alguns produtos exóticos que sempre se encontram nestes locais. Após frustrantes tentativas de descodificação de frutas e legumes, seguimos para o bairro islâmico.
Na altura não sabíamos sequer para onde nos dirigíamos, mas uma placa dava-nos as boas vindas ao local. Este bairro revelou-se absolutamente surpreendente. Tendo nascido dos comerciantes muçulmanos que percorriam a rota da seda, pode dizer-se que será o mais antigo de Xian.
Entre ruelas intrincadas, fomos avançando numa miríade de estabelecimentos e bancas que vendiam de tudo um pouco. Da nossa parte, devemos confessar que gostámos bastante dos grilos e das suas minúsculas gaiolas de verga, que são vendidos como animais de estimação. Seguindo a tradição dos seus ancestrais, aqui o comércio é frenético, existindo produtos para todos os gostos, desde os tradicionais restaurantes às lojas de chá até às lojas onde se vendem cartazes de caligrafia chinesa.
O contacto com os orgulhosos homens religiosamente barbudos e de imponentes turbantes brancos em riste, fez-nos descansar um pouco da cultura chinesa. O bairro era realmente muito interessante e após uma consulta à nossa bíblia de viagens, o lonely planet claro, apontámos a bússola para o ponto de interesse mais destacado do bairro: A grande mesquita. Embora localizada aqui desde tempos imemoriais, o edifício actual da grande mesquita data do século XVIII e é um local extremamente calmo e apaziguador. É uma simbiose da cultura árabe com a cultura chinesa, e assim ao longo dos jardins bem cuidados que íamos percorrendo, despontavam alguns templos em forma de pagode. Mereceu indiscutivelmente a visita!

À saída voltámos a perder-nos no labirinto de ruelas que a cada esquina nos mostravam mais bancas artesanais de produtos vários e comida. Ficou-nos na retina, uma banca onde confeccionavam de forma artesanal uns atractivos chupa-chupas que nos faziam recuar no tempo e que deliciavam a criançada que ali acorria em grande número.

Deliciados com a experiência, fomos ficando por ali até já serem horas de jantar. Um primeiro olhar para o restaurante… Perfeito, éramos os únicos de olhos redondos! Depois de uma série de conversas mutuamente incompreensíveis e auxiliados pela sempre universal linguagem gestual, lá conseguimos pedir umas pequenas espetadas de diferentes tipos de carne sem picante… Algumas garrafas de água depois, com muitos gestos pelo meio, lá conseguimos a segunda rodada de espetadas, desta vez mesmo sem picante!

A autenticidade e espontaneidade vivida naquele restaurante era directamente proporcional à inequívoca falta de condições para os nossos padrões ocidentais. Os preços também não estavam absolutamente de acordo com os nossos padrões. Por menos de 5 euros comemos algumas dezenas de pequenas espetadas e bebemos umas garrafas de água e coca-cola! O mais engraçado, é que no dia seguinte descobriríamos que tínhamos sido enganados e que pagáramos o dobro do que seria devido.

Recolhemo-nos no hotel ainda embalados pelo bonito espectáculo dos extensos papagaios de papel, que em movimentos ritmados pelo vento, pareciam querem rasgar o céu...